Quelhas, Tremelgas e Pata-Roxas

Sempre fui avesso a efemérides do tipo "Dia do..". Sinto-as sempre imbuídas dum sub-reptício espírito mercantilista, que mais do que tudo dinamiza o comércio duma panóplia de artigos perfeitamente inúteis.

Não é decerto essa a intenção da Câmara Municipal de Peniche, ao assinalar o animalesco Dia do Animal a 4 de Outubro, e por isso lhe dou aqui conta. Por isso, e porque a actividade encontrada para assinalar o dia me parece interessante e original. Trata-de de desmistificar a imagem de animais agressivos e violentos que está associada aos tubarões, bem como alertar os mais novos para necessidade de proteger a vida animal marinha. É uma acção dirigida aos alunos do ensino Pré-Escolar do Concelho de Peniche e tem como contador de "estórias" um biólogo marinho, da Associação Portuguesa dos Elasmobrânquios. "Tubarões, Raias e Cações – a verdadeira estória" foi o nome dado a esta iniciativa.

Vão dizer que acordei arrevesado, mas não posso discordar mais deste nome. Desde logo o recurso ao Tubarão, num recorrente abuso do vulgar e sisudo esquálido como cabeça de cartaz. Ficaram assim de fora as hilariantes Quelhas, tão queridas dos penicheiros, e que tantos momentos de desenfreada gargalhada nos têm proporcionado. O facto de não se integrarem neste grupo é apenas uma pequena minudência. Já a preferência pela Raia em detrimento da Tremelga consegue ser mais chocante que a reacção do citado animal à presença de intrusos. A tremelga é trunfo assíduo das caldeiradas dos penicheiros, que só na sua ausência se contentam com a sucedânea raia. Mas mais grave ainda é o recurso ao Cação, verdadeiro cabeça de Cartaz de terras alentejanas, mas que aqui bem poderia ter sido preterido em favor da saborosa Denisa ou da popular Pata-Roxa, já para não falar dos tão apetecíveis Quelmes secos. Tanto mais que esta escolha não carece de parecer favorável do Presidente da Assembleia Municipal....